quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Em qual mar sua coragem esqueceu como nadar?

E aqueles sonhos perfeitamente factíveis? Aqueles que demandam organização, disciplina e força de vontade, os que nos ensinam a aprender a conviver, dialogar e passar por cima das pequenas coisas em prol da evolução das grandes coisas? Aqueles que envolvem o dia a dia penoso do passo-a-passo constante. Aqueles que nos pedem uma relação saudável e madura com o tempo. Onde foram parar?
Andamos muito desesperados com o "fast-food" mental de informações desconexas e promessas de realização instantânea, como se aprender uma língua ou um novo emprego fosse uma espécie de "plug and play", onde habilidades e resultados fossem questões de "downloading". Elas simplesmente não são. E quanto mais esperarmos que elas sejam, maior será a nossa frustração com essa expectativa ridícula. Ok, você pode não ter gostado do adjetivo que eu coloquei para esse tipo de expectativa, mas leve ela para o mundo e ele vai ridicularizar ela, independente do adjetivo que eu usar aqui.
No trabalho como coach sempre ouço frases como "mas isso vai levar muito tempo" e me é inevitável perguntar: "Ok, se você não fizer nada disso, se não começar agora, o tempo vai parar de passar?".
Desaprendemos, diariamente, a conviver com Saturno, com Cronos, com a dimensão trabalhosa e diária das tarefas cotidianas, com o fazer e o refazer, com a dedicação, com os pequenos sacrifícios diários. Muitos me perguntam porque não trabalho, por exemplo, no "nicho" do Coaching para "emagrecimento", já que eu gosto de malhar e ter uma boa forma etc. A resposta é sempre a mesma: Porque, a meu ver (e é só o meu mapa e são só as minhas crenças) emagrecer por emagrecer é como enriquecer por enriquecer, como expandir territórios numa guerra de ocupação pelo simples ato de expandir territórios.
Para mim, que procuro observar e buscar na natureza a lógica do meu trabalho e as metáforas que o tornem ecológico (no sentido de bom para a nossa "casa-planeta" ou a nossa "casa-sociedade"; oikos, palavra grega, significa "casa" em português) a única coisa que cresce pelo simples ato de crescer e que se expande pelo simples ato de se expandir é um câncer. E todos sabemos o que tumores fazem com os sistemas em que se instalam: enfraquecem, debilitam, exterminam.
Até que ponto precisamos reaprender a conviver com limites? Limites para a produção, para o consumo, para o trabalho, para o lazer, para o convívio. A que ponto estamos indo nessa busca desenfreada por uma liberdade infantilizada que pretende existir por cima e para além das liberdades dos outros? Quando foi que desaprendemos a ouvir e começamos a simplesmente esperar a nossa vez de falar? Quando foi que aprendemos a começar todas as frases por "não, mas...", destruindo toda forma de diálogo, desestruturando pela base toda a cadeia de trocas, aprendizados, acordos e concessões que deu origem à nossa e a todas as demais sociedades no mundo?
Em qual mar sua coragem de conviver, sentir, se importar e se relacionar esqueceu como nadar?
Como anda a sua relação com seus limites?

Renato Kress

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